Por Lívia Correa
Com o presente artigo, temos o intuito de trazer mais uma lei voltada para a prevenção e a proteção em relação ao assédio nas empresas, qual seja, a Lei nº 14.457, de 21 de setembro de 2022 (Programa Emprega + Mulheres), traçando um paralelo e demonstrando como ambas as normas se complementam em relação a proteção ao empregado e algumas medidas e posturas a serem observadas e adotadas pelas empresas.
O assédio no ambiente de trabalho é um fenômeno complexo e persistente que afeta trabalhadores e trabalhadoras de diferentes setores e níveis hierárquicos. Seus impactos vão além do sofrimento individual das vítimas, comprometendo também o bom funcionamento das organizações. A crescente visibilidade de casos de assédio moral e sexual, impulsionada por movimentos sociais e pela amplificação digital das denúncias, tem provocado respostas institucionais mais consistentes, tanto por parte do legislador quanto do Poder Judiciário.
Nesse cenário, este artigo propõe uma análise crítica e jurídica do assédio nas relações de trabalho, com ênfase nas inovações trazidas pela Lei nº 14.457/2022 e sua relação com as atualizações da Norma Regulamentadora nº 1 (NR-1), que trata do gerenciamento de riscos ocupacionais.
A Lei nº 14.457, de 21 de setembro de 2022, instituiu o Programa Emprega + Mulheres com o objetivo de promover ambientes de trabalho mais seguros, inclusivos e igualitários. Dentre suas diretrizes, destacam-se medidas voltadas à prevenção e ao enfrentamento do assédio sexual e de outras formas de violência no ambiente laboral. As empresas passaram a ser obrigadas a incluir regras de conduta em seus códigos internos, estabelecer canais eficazes para recebimento e apuração de denúncias, oferecer capacitação e sensibilização aos trabalhadores, além de incorporar o tema à atuação da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes, que passou a se chamar Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e de Assédio (CIPA).
Em consonância com essa legislação, a NR-1 foi atualizada pela Portaria MTP nº 4.219, de 22 de dezembro de 2022, para contemplar entre os fatores de risco os chamados riscos psicossociais. Essa mudança exige que as empresas passem a identificar e adotar medidas específicas de prevenção e controle de fatores como assédio, pressão excessiva e ambiente tóxico, em alinhamento com as diretrizes trazidas pela Lei nº 14.457/2022.
O assédio moral se caracteriza por condutas abusivas reiteradas que expõem o trabalhador a situações humilhantes, vexatórias ou constrangedoras, com o intuito de desestabilizá-lo emocional ou profissionalmente. Tal prática viola princípios constitucionais fundamentais, como a dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho, gerando a responsabilidade do empregador em caso de omissão ou conivência.
A Lei nº 14.457/2022, portanto, representa um marco no enfrentamento dessas práticas. Ao estabelecer obrigações preventivas e fortalecer o papel da CIPA, ela atribui maior responsabilidade às empresas na criação de ambientes seguros e na proteção dos direitos fundamentais dos trabalhadores. A CIPA ganha protagonismo ao ser incumbida de incorporar ações permanentes de prevenção ao assédio, tornando-se um dos pilares na promoção de ambientes laborais saudáveis.
Tanto a nova lei quanto a atualização normativa da NR-1 atuam de forma integrada na construção de uma nova cultura organizacional, que prioriza a prevenção ao assédio e a promoção de um ambiente laboral mais ético, seguro e respeitoso.
No campo da responsabilidade jurídica, a empresa pode responder subjetiva ou objetivamente, a depender do caso concreto. O artigo 157 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) já previa o dever do empregador de assegurar condições adequadas de saúde e segurança no ambiente laboral. A omissão na apuração de denúncias, a ausência de medidas preventivas ou a tolerância com comportamentos inadequados configuram falhas graves no dever de vigilância, sujeitando o empregador à responsabilização por danos morais, conforme pacificado na jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST).
No entanto, a simples formalização de normas não é suficiente para erradicar o problema. A eficácia da legislação depende de uma mudança cultural nas organizações. A prevenção efetiva do assédio exige um compromisso institucional que vá além do cumprimento burocrático, incorporando práticas consistentes como: comissões independentes para apuração de denúncias, treinamentos contínuos, políticas de tolerância zero e a promoção de lideranças éticas e comprometidas. O setor de recursos humanos, em especial, tem papel estratégico nesse processo, atuando como guardião da cultura organizacional e das boas práticas de convivência.
Conclui-se que o enfrentamento do assédio moral e sexual no trabalho exige uma abordagem contínua, multidisciplinar e transformadora. A Lei nº 14.457/2022 representa um avanço significativo ao instituir mecanismos preventivos e impor maior responsabilidade ao empregador, mas sua real eficácia depende da mudança de estruturas, comportamentos e mentalidades dentro das organizações. Somente com políticas claras, canais de denúncia acessíveis, proteção efetiva às vítimas e responsabilização dos agressores será possível consolidar um ambiente de trabalho ético, digno e verdadeiramente seguro — pautado no respeito à dignidade da pessoa humana, fundamento essencial de toda relação laboral justa e sustentável.